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terça-feira, 16 de maio de 2017

Mudanças: Projeto de lei que reforma Código Penal por estupro.

Um projeto de lei que reforma o Código Penal na parte dos crimes sexuais está no centro de um debate acalorado. A proposta cria o delito de estupro coletivo e de exibição de cena de sexo por vingança, entre outras alterações inspiradas em casos recentes, mas também prevê a redução de pena para a violência sexual cometida sem graves danos à vítima, como apalpar partes íntimas ou forçar um beijo.
Condutas dessa natureza são consideradas estupro desde 2009, quando a lei foi alterada para definir o crime como “qualquer ato libidinoso” e não apenas penetração. A mudança, apontada como avanço por punir mais adequadamente os agressores, trouxe um efeito colateral. Tribunais em todo o país têm desclassificado o delito para contravenção penal, punido na prática com multa e serviços comunitários, quando a conduta foi de menor potencial ofensivo.
A alegação é de que a pena prevista para estupro — de oito a 15 anos se a vítima for menor de 14 anos (estupro de vulnerável) e de seis a 10 anos no caso de vítimas adultas — é exagerada para punir atos “menos graves”. Ao julgar um homem por passar a mão nos seios da enteada de 10 anos, um magistrado de Santos (SP) justificou: “Simples contatos físicos, ainda que lascivos, sem maior repercussão devem ser enquadrados na Lei de Contravenções Penais”.
A declaração do desembargador resume bem o teor de 30 sentenças de várias partes do país, incluindo a de Santos. Em todas, a vítima era criança ou adolescente e já tinha havido o trânsito em julgado. Ou seja, a desclassificação do crime de estupro de vulnerável para uma mera contravenção foi a resposta final da Justiça.
Ao menos 330 recursos envolvendo a mesma desclassificação chegaram ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) desde 2009, após a mudança na lei do estupro. A maioria das apelações foi movida pelo Ministério Público contra a decisão de considerar o crime praticado contra criança ou adolescente uma mera importunação ao pudor, deixando o agressor impune. Os dados foram levantados pelo gabinete do ministro do STJ Rogério Schietti.
Por conta desses repetidos recursos, Schietti participou da elaboração do trecho do projeto de lei que diminui a pena de um sexto a dois terços no crime de estupro de vulnerável — passaria a oscilar, portanto, de dois anos e oito meses a seis anos e oito meses. A medida é, segundo ele, necessária para evitar a desclassificação do crime. E permitirá, defende o ministro, a aplicação de pena proporcional.
Apesar da boa intenção, o projeto está longe de ser unanimidade. A proposta também cria uma pena menor para a violência sexual de “menor dano”, no caso de vítimas adultas. Mas é o estupro de vulnerável o que mais preocupa especialistas: crianças e adolescentes têm menos capacidade de resistência contra os atos, mesmo os considerados menos graves.
O projeto coloca condições que devem ser observadas para que os réus acusados de estuprar criança ou adolescente tenham direito à pena menor: não ter praticado o ato com “violência física ou psicológica”; não ter introduzido membro ou objeto nas cavidades vaginal, oral ou anal da vítima; não ter invadido gravemente a privacidade da vítima ou humilhá-la; não ter antecedentes por crimes da mesma natureza.
Os próprios quesitos colocados no projeto, que está na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara, são apontados como falhos por críticos da ideia. Há, porém, quem os apoie. A opinião de profissionais que trabalham no dia a dia com o tema da violência sexual mostra o nível de complexidade da questão que envolve, de um lado, uma tentativa de diminuir a impunidade e, de outro, um risco de retrocessos no combate à violência contra a mulher e na proteção a crianças e adolescentes.
O promotor de Justiça de Alagoas Lucas Sachsida Junqueira Carneiro, que cuida de crimes contra crianças e adolescentes, é totalmente contrário ao projeto e acredita que “a dignidade violada não tem a ver com penetração ou sexo oral”.
“A vivência na promotoria mostra que, nos crimes contra criança e adolescente, é muito comum não haver penetração ou sexo oral, mas isso não é fator determinante das graves consequências que a vítima vai carregar, como dificuldades afetivas e de adaptação social”, diz ele. “É preciso discutir com a população, olhar dados criminais, chamar os conselhos tutelares, a classe médica. Não dá para se basear só na jurisprudência para fazer uma alteração como essa.
O Sul. 

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