Um programa de compra de remédios na Petrobras se tranformou em mais uma fonte de fraudes. Até cachorro teve a conta da farmácia bancada pelos cofres da empresa.
Há 10 anos, a Petrobras tem um programa de benefício em que paga ou reembolsa a compra de medicamentos dos funcionários. Funcionava desta maneira: o funcionário ia até uma farmácia conveniada, apresentava a receita médica e o cartão do programa de saúde da Petrobras. A farmácia enviava a conta para uma empresa contratada pela estatal para administrar o programa, e o custo era repassado pela Petrobras. Pela regra, o funcionário só poderia comprar remédios para si mesmo e seus dependentes, que ganhavam números de registro próprios no programa.
Por mês, o gasto médio da Petrobras apenas com esse benefício era de R$ 20 milhões. Em setembro do ano passado, a estatal mudou o modelo do benefício, para tentar economizar. Uma nova empresa, chamada Global Saúde, assumiu a administração. A contratada passou a receber um valor fixo de R$ 15 milhões e deveria olhar muito bem os pagamentos do benefício, para economizar o máximo possível e assim, ter lucro.
O resultado foi impressionante: em apenas seis meses, a nova empresa encontrou mais de 13 mil receitas fraudulentas, muitas notas em branco, sem data, até mesmo sem o nome do médico.
A empresa denunciou a fraude para a secretaria de controle externo de estatais do Tribunal de Contas da União. Segundo Ricardo Gabin, chefe de gabinete do relator do processo no TCU, o programa apresentava vulnerabilidades: "Um programa altamente sujeito a fraudes, né? A gente imagina que o funcionário precisa apenas ir a uma farmácia credenciada com uma receita médica, obter o medicamento que, supostamente, ele precisa".
No dia 27 de julho do ano passado, um mesmo beneficiário, com o mesmo número de registro, fez nove compras. Às 9:22 em Candeias, na Bahia. Apenas seis minutos depois, às 9:28, outra compra foi feita em Angras dos Reis, no RJ. Às 9:35, mais uma compra - em Salvador. E em seguida, no RJ novamente e em SP. Depois, no RJ, em Aracaju, outra no RJ e, por último, em Salvador.
A reportagem conversou com a dona do cartão usado nessas compras, a aposentada Dulce dos Fernandes Pereira, de Salvador:
REPÓRTER - Apareceu no dia 27, segundo o TCU, num mesmo dia, a senhora comprando remédios em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, em São Paulo, em Aracajú, em nove cidades diferentes.
DULCE - Não, de maneira alguma. Inclusive já tem mais de três anos que eu não viajo.
O TCU suspeita que o nome dela pode ter sido usado sem o conhecimento da aposentada. O benefício é pessoal e intransferível. O nome da receita deve ser o mesmo do cartão do programa.
O Fantástico foi atrás de casos que chamaram a atenção do TCU. Tem caso de homem que comprou remédio para amamentação. E o de uma mulher, que usou o programa da Petrobras para comprar o medicamento Tamsulan - indicado para tratamento de problemas na próstata.
O caso mais impressionante ocorreu em Curitiba, no Paraná. A receita de uma clínica veterinária foi usada em uma farmácia, também pelo programa da Petrobras. O nome do paciente, indicado na receita é Iza. É a cachorra de Vanessa Silva, esposa de um funcionário da Petrobras. A reportagem conversou com Vanessa:
VANESSA - Ah, eu não quero gravar.
REPÓRTER - Eu quero, porque é uma reportagem que diz que você comprou remédios para o seu cachorro usando o programa de farmácia da Petrobras. O programa é para beneficiar você, né?
VANESSA - Mas é que faz parte da minha família, e é pra comprar remédio. Se eu tenho esse desconto, eu tenho direito de ter o desconto em remédio.
Todas elas parecem fraudes pequenas. Mas juntas, criam um rombo enorme. E, como tudo na Petrobras, os números são gigantescos. O programa é para 300 mil pessoas. O gasto mensal é de mais de R$ 20 milhões. E o cálculo é que 30% disso são compras fraudadas de remédios - um rombo de mais de R$ 6 milhões por mês.
Em setembro do ano passado, quando o TCU recebeu as denúncias, foi determinado que a Petrobras interrompesse o programa. O gasto diminuiu, mas provocou um efeito colateral: os beneficiários agora precisam comprar os medicamentos, e pedir o reembolso apenas quando o programa for retomado.
O aposentado pela Petrobras Fred Nicolai esá desanimado: "Quanto mais aumenta isso aqui [mostra as contas], menos esperança nós temos de que vamos receber, né?"
REPÓRTER - Quanto o senhor acredita que gasta. por mês, em remédios que não estão sendo reembolsados?
FRED - Por baixo, assim, acredito que em torno de R$ 500. Eu acredito que já tenha em torno de R$ 5 mil.
O TCU calcula que a Petrobras já deva R$ 200 milhões para os beneficiários. Nesta semana o órgão vai julgar se a estatal deve encerrar o programa, ou criar novos mecanismos de controles para estas compras. "Da parte da Petrobras, não existe nenhum tipo de controle", afirmou Ricardo Gabin.
Em nota, a Petrobras afirmou que tomará todas as medidas legais cabíveis para a reparação e compensação de danos, além de eventuais ações de improbidade administrativa.
Se a auditoria do TCU comprovar as fraudes, os funcionários envolvidos podem perder os cargos e serem obrigados a ressarcir a Petrobras.
Com informações do http://g1.globo.com
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